Se falarmos com um “bom garfo”,
dificilmente encontraremos alguém que não goste de um bom refugado preparado
com boa mão para o tempero, que se quer acentuado, não exagerado, é comida
muito saborosa que faz jus ao dito, “o que sabe bem faz mal”.
O refugado deriva de refugo já que
o prato pode ser confecionado com restos de outras refeições, as duas palavras
(restos e refugo) contém no entanto uma carga negativa próxima do asco,
salva-se o diminutivo, restinho, que é associado à melhor parte.Mas não é para exibir as minhas (reconhecidas) qualidades de “maître de cuisine” que escrevo estas linhas, faço-o para mostrar o meu desagrado com algumas reprises que se tornam fastidiosas porque, mexendo com os sentimentos, visam o lucro fácil e rápido, em suma, refugo nojento.
Qualquer pessoa minimamente informada associa o nome “Gisberta” a um grupo de “institucionalizados” das (encerradas) Oficinas de S. José que em Fevereiro de 2006 (continuadamente, durante 3 dias) agrediram uma já muito debilitada transexual acabando por atirá-la a um charco de água num prédio em obras (embargado há muitos anos, de fácil acesso, sem vigilância policial) frequentado por toxicodependentes, homossexuais e sem-abrigo.
A justiça acabou por condenar os jovens agressores a penas dos 11 aos 13 meses de internamento por maus tratos, já que o relatório da autópsia referiu afogamento como causa da morte.
Não pertencendo a qualquer organização de defesa dos direitos da população gay, lésbica, bissexual ou transgénero, insurgi-me contra a benevolência da justiça porque em audiência se provou que foram os jovens agressores quem atiraram “Gisberta” para o “poço”.
Durante todos estes anos, de 2006 até hoje, remoí a minha indignação com este caso, constou-se-me (há época) que os jovens internados nas Oficinas de S. José eram, tal como noutras instituições do género, sujeitos a sevícias sexuais por parte de alguns perfeitos (espécie de educadores), que destes houve mesmo quem chegasse a inspetor da Polícia Judiciária, que um deles até fazia parte da brigada que se ocupou da averiguação, e que a aprofundação da investigação levaria a outro mega processo como o da Casa Pia, parecem ter sido várias as razões que justificaram a injustificável pressa em fechar o processo.
Toda esta minha indignação se me aflorou porque Rita Ribeiro, uma conceituada atriz portuguesa, repõe (mais uma vez) em várias salas de Portugal a peça “Gisberta” da autoria do encenador brasileiro Eduardo Gaspar sem acrescentar nada ao original.
Em tempos de crise quem vive da cultura passa mal, recorrer ao âmago das pessoas resulta quase sempre, já os mendigos pedem “uma esmolinha por quem lá tem”.